Em segundo lugar, esse serviço tem que ser muito real. Não podemos ficar em palavras. «Não são aqueles que dizem: "Senhor, Senhor" , que entrarão no Reino, mas aqueles que fazem [sempre o verbo fazer] a vontade do meu Pai» (Mt 7, 21). «Meus filhinhos, não amemos em palavras e com a língua, mas em actos e em verdade» ( 1 Jo 3, 18). (...)
Em terceiro lugar, o nosso serviço deve procurar ser perfeito - nunca o será, claro - porque se trata de Deus e a caridade fraterna é uma virtude teologal (...) . As virtudes teologais são as que nos ligam directamente a Deus. Tenhamos presente a grande cena do juízo final, em Mateus 25. O infeliz que alimentaste, o mendigo que vestiste, o prisioneiro que visitaste, o desgraçado a quem ninguém amava e que olhaste com amizade, era eu. Jesus está no mendigo, na religiosa marginalizada na sua comunidade por não ter um feitio fácil. E Jesus, é rigorosamente Jesus. É preciso respeitar Deus em todo e qualquer serviço humano. Isto exclui, à partida, a negligência voluntária.
Em quarto lugar, o serviço deve ser desinteressado. (...) A recompensa é amar como Deus ama. Não há outra. A recompensa do nosso desinteresse medíocre será um desinteresse absoluto. A nossa recompensa será a de nos apagarmos completamente e ficarmos felizes por não dizer «eu» durante toda a eternidade, de tal maneira seremos movimento puro para o outro e para os outros.(...)
Façamos a pergunta a nós mesmos: verdadeiramente, desejamos outra recompensa além dessa? Servimos os irmãos para assegurar a salvação? Espero que não. Servimos os irmãos porque somos amados. Qual é de facto a pureza do nosso serviço? É precisamente porque somos amados que não podemos deixar de querer amar sempre mais. (...) Tenho desinteresse porque sou amado. E o que Deus me dá em recompensa é um desinteresse ainda maior. Jesus diz para nos considerarmos «servos inúteis» (Lc 17, 10).
É evidente que servir a Deus não é prestar-Lhe um serviço. Que serviço poderíamos prestar a Deus? Servir a Deus é assemelharmos-nos a Ele. É ser verdadeira e plenamente homem. É sermos filhos dignos do nosso Pai. Creio que Deus não nos tratará como servos inúteis. Segundo o Evangelho, somos nós que devemos dizê-lo: «Quando tiverdes feito tudo o que tendes a fazer, dizei a vós mesmos: Somos servos inúteis». Mas não há o perigo que Deus nos diga isso. O que Ele quer é chamar-nos seus amigos. Nós é que entendemos que somos servos. Mas os serviços que prestamos são serviços de amigos de Jesus, mesmo que seja a mais ingrata das tarefas humanas, a mais monótona, a que mais vazia nos parece de toda a amizade humana.
E finalmente - mas nunca chegaríamos ao fim - o nosso serviço deve ser fiel, quer dizer, sem desistências, sem desânimos. Não há nada como os pequenos trabalhos humildes e monótonos para revelarem a verdadeira fidelidade do coração. É preciso muito mais amor para dar a vida gota a gota, de manhã à noite, dia após dia, sem afrouxar e sem desanimar, numa vida difícil de comunidade, do que para dar a vida toda de uma só vez. Não há nada mais difícil do que uma comunidade humana. Bonhoeffer dizia: «Não pode deixar de ser um dom de Deus». Creio que não há comunidade sem o Espírito Santo; fora dele é pura ilusão.
François Varillon S. J. , em "Viver o Evangelho"
2 comentários:
Postagem muito profunda, pelo que vejo este livro é muito bom.
Muito bom ... muito bom !
abraços
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