quinta-feira, 11 de março de 2021

VOLTAR A JESUS


"Recentemente, um jovem perguntou-me que mudança eu queria ver na nossa sociedade. A minha resposta deixou-o surpreso. Disse que desejo que uma certa categoria de cristãos, em particular aqueles nos círculos internos da Igreja, mudem a maneira de ver a sua fé. Suspeito de que muitos católicos estão sofrendo pela exaustão, pela falsificação e pela banalização da nossa fé em Cristo!

Nenhum estudo científico é necessário para concluir que muitas pessoas batizadas estão a abandonar a religião. A nossa comunidade religiosa está a transformar-se numa comunidade de cabelos brancos! Aqueles que abandonam a Igreja não são desfavorecidos de inteligência. Também não são contrários ao fenómeno religioso. Eles simplesmente perderam o interesse ou sentem-se afastados porque nos veem "brincando de Igreja". É a forma como apresentamos o Evangelho, celebramos a nossa liturgia e, também, a nossa incoerência flagrante que faz com que as pessoas se sintam espiritualmente enganadas.

Hoje em dia, muitos filósofos confirmam que o desejo religioso é um facto antropológico que pode tomar muitas formas, mas que não pode ser erradicado. Para mim, isso confirma que existe um desejo implícito de conhecer a Cristo no coração de cada homem.

O homem contemporâneo ainda tem sede de fé, mas talvez tenha menos de religião. Devido ao seu desencantamento em assuntos que dizem respeito à fé, o homem moderno prefere percorrer um caminho diferente. Ele tem uma nova forma de ver o mundo e nós, enquanto Igreja, ainda estamos agarrados a uma visão obsoleta.

Precisamos ajudar o homem a descobrir a autenticidade original da fé cristã, precisamos ajudá-lo a dar o salto de uma religião de conveniência para uma religião de convicção; de uma religião cheia de leis a uma religião que nos dá o gosto da verdadeira liberdade; de uma religião de rituais vazios para uma religião que nos abre para o mistério.

É válido admirar a magnífica história da Igreja, mas não podemos continuar a gastar a nossa energia numa tradição que pode ter embaçado a nossa visão daquilo Cristo propõe.
Neste contexto, as palavras de Marcel Gauchet vêm à mente. Ele diz que o cristianismo "é a religião do fim da religião".

Os Evangelhos confirmam a tese de Gauchet de que o cristianismo deve trazer ao fim um certo tipo de religião. Foi isto que Cristo fez. Ele criticou flagrantemente certas práticas religiosas. Ele afirmou que o homem vem antes da lei! Ele deu um novo centro a uma religião que estava focada em sacrifícios: o amor (Mc 12, 33). Ele falou sobre a necessidade de derrubar o templo de Jerusalém para ele construí-lo novamente (Jn 2, 19).

Tudo isso serve para mostrar que o desafio que a Igreja está enfrentando é interno. Temos de trazer ordem à nossa própria casa para não corrermos o risco de acabar com um corpo sem alma. O adversário da nossa fé cristã não é o ateísmo, o secularismo ou o anticlericalismo, mas a nossa atual religiosidade cristã. Estamos tão cheios da nossa própria espiritualidade e de nós mesmos que deixamos pouco ou nenhum espaço para Cristo."
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Mario Grech, bispo de Gozo (Malta), in The Malta Independent, 15-04-2018. (adaptado)


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