sábado, 28 de maio de 2016

Quem é que tem medo da verdade?


Aproximou-se um homem habituado

ao uso inveterado do silêncio
o seu olhar varrendo toda a fraude
das palavras
Aproximou-se firme e impoluto
Esquadrinhou as faces oxidadas
da mentira
Olhou depois o chão como quem abre
um sepulcro
e lentamente desenhou
o puro rosto da verdade
sobre a areia.


Levantou depois os olhos azulados
À sua frente havia apenas céu
Para onde tinham ido os impostores? 
Quem é que tem medo da verdade? 
Baixou de novo os olhos 
e guardou na areia seca do deserto dois loiros grãos de trigo 
dois pedaços de azul
duas lágrimas
duas palavras interditas.

António Couto

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