segunda-feira, 29 de setembro de 2008

DESPOJAR-SE


«Bem-aventurados os que têm um coração de pobre, porque deles é o Reino dos céus!» (Mt. 5,3)

«À medida que o homem se vai fazendo pobre, despojando-se de toda a apropriação interior e exterior, e isto feito em função de Deus, automática e simultaneamente começa o Santo Reino de Deus a desenvolver-se no seu interior.
Se Jesus disse que o primeiro mandamento contém e esgota toda a escritura (Mt 22, 40), nós podemos acrescentar paralelamente que a primeira bem-aventurança contém e esgota todo o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo.

A libertação caminha, pois, pelo caminho da pobreza. O Reino é como um eixo extraordinariamente simples que atravessa toda a Bíblia movendo-se sobre dois pontos de apoio: o primeiro mandamento e a primeira bem-aventurança (Ignacio Larrañaga, em "Mostra-me o Teu Rosto")

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

NO SEIO DE DEUS


"Entrar no seio de Deus" é uma expressão que se encontra na Bíblia.
A Bíblia é um livro que a maior parte das pessoas não lê, tão espesso que parece uma floresta abandonada, invadida pelo mato e percorrida por animais selvagens que vivem longe do olhar dos homens.
Achei durante muito tempo que esta expressão era apenas uma liberdade poética, projectando uma bela luz, uma entre milhares que encontramos na Bíblia e nas florestas ao abandono.
Só esta manhã, ao ver os pardais mergulhar às dezenas na folhagem perfumada da tília, percebi por fim o que era o seio de Deus e que delícia podia ser entrar nele um dia." - (Christian Bobin, em "Ressuscitar")

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

AMIGO DO POBRE


«O segredo de Jesus, é o de encontrar na humildade e na pequenez os mais pequenos
para criar com eles comunidades de esperança,
comunidades do Reino. (...)

Não procures a companhia dos poderosos,
mas desce os degraus
para encontrar os mais pobres,
não sobretudo para fazer algo por eles
nem para ter o orgulho de ter feito algo de bom,
mas simplesmente para os encontrares,
para entrares em comunhão com eles,
para te ligares a eles pela amizade.

Eis o segredo: se te tornares amigo do pobre,
serás abençoado por Deus.
Descobrirás algo de inteiramente novo,
descobrirás que o Evangelho é realmente uma boa-nova,
que é uma solução para as feridas da humanidade,
uma resposta para acabar com toda essa história de guerra
e violência entre os homens,
essa luta fraticida em que Caim mata Abel,
em que cada um se esforça por manter o seu irmão ao fundo
dos degraus para se sentir superior,
emparedado pelo medo de ser desalojado por outro mais forte.

Assim, Jesus diz-nos:
"Pára de ter medo;
pára de te proteger,
de te defender,
de te justificar,
de te fechar no círculo estreito daqueles que são como tu.
Aceita as diferenças:
cada um no seu lugar mas em conjunto é que tem que se viver.
Desce os degraus para te tornares amigo do pobre
e amigo de Deus".»
(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

domingo, 21 de setembro de 2008

HENRI NOUWEN

Henri Nouwen (24 de Janeiro de 1932 - 21 de Setembro de1996)


Passam hoje 12 anos sobre a morte de Henri Nouwen. Recentemente, tive o privilégio de ler uma biografia dele: "O Profeta Ferido - Um retrato de Henri J. M. Nouwen" - Michael Ford.

Fiquei a conhecer um pouco melhor um dos meus autores espirituais predilectos. Os livros de Henri Nouwen são para mim um tesouro espiritual inestimável, que costumo partilhar convosco através de algumas passagens e alguns trechos seleccionados dos livros que vou lendo.

Hoje, escolhi algumas passagens da biografia que li recentemente; mais concretamente passagens alusivas ao aniversário da sua morte.

No seu elogio fúnebre, Jean Vanier, disse:


"Por vezes, eu senti em Henri o coração ferido de Cristo, a angústia de Cristo. De facto, Deus não é um Deus seguro, lá no céu, que diz a toda a gente o que deve fazer, mas um Deus angustiado e sedento de amor; um Deus que não é compreendido, um Deus que tem sido rotulado pelas pessoas. O nosso Deus é um amante, um amante ferido. É este o mistério de Cristo, o amante ferido. E Henri também o é - esteja ele onde estiver - um amante ferido, sedento de amor, sedento de anunciar o amor.(...)
Muitas pessoas hão-de chorar porque havia qualquer coisa de profético em Henri. Ele aceitava a dor, optava por caminhar através da dor, pois é esse o caminho de todos nós. Escolher a cruz, caminhar através da cruz, pois nunca descobriremos a ressurreição, a menos que caminhemos através da cruz, a menos que, algures, nos deixemos despojar."

Sue Mosteller prestou-lhe a seguinte homenagem:


«Basta-nos olhar à nossa volta, nesta igreja, para ver como ele estendeu pontes entre nós, estabelecendo a união: ricos e pobres (...), de ambientes, culturas e confissões religiosas diferentes. Henri congregou-nos a todos. Cada um de nós o conheceu e o escutou, e todos dissemos: «É bom. Dá-nos mais.» Lemos os seus livros e dissemos: «É bom, dá-nos mais.» Agora ele deixou-nos e chegou a hora de assumirmos a responsabilidade da espiritualidade que nos legou.(...) Henri foi enviado a transmitir-nos: não tenhais medo da vossa dor, optai por amar quando as relações são difíceis, optai por acreditar quando a esperança fraqueja, ajudai-vos uns aos outros, ultrapassai os sentimentos de amargura e ressentimento para entrar em união uns com os outros, perdoai-vos uns aos outros do fundo do coração, porque Deus está perto e chama «Amado» a cada um de nós. Esta chamada a sair da nossa adolescência espiritual é o legado de Henri.»
(Michael Ford in "O Profeta Ferido - um retrato de Henri J. M. Nouwen")

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

DEUS NUNCA SE DECEPCIONA

«Somos moldados por todas as graças que recebemos, por todas as graças que recusámos,
por todos os gestos de amor e todos os gestos de ódio ou de indiferença,
pelos nossos fracassos e os nossos êxitos;
tudo, literalmente tudo se inscreve na nossa carne.


Assim, a experiência do amor de Deus por nós,
experiência que fazemos um dia (...),
não muda a nossa história nem o que nos moldou,
mas muda-nos porque nos revela que Deus nos ama,
tal como somos,
não tais como gostaríamos de ser,
não tais como a sociedade ou os nosso pais gostariam que fôssemos,
mas tais como somos hoje, com as nossas fragilidades, as nossas feridas,
os nosso medos, as nossas qualidades e os nosso defeitos.

Tais como somos hoje, somos amados por Deus.


E, se temos a impressão de que constantemente decepcionamos os outros,
que somos incapazes de corresponder às suas expectativas,
à sua confiança, às esperanças que depositaram em nós;
se temos o sentimento de que há uma distância
entre o que parecemos ser e o que somos na realidade,
entre aquilo que os outros pensam que somos capazes de fazer e o que podemos fazer de facto, então é preciso que saibamos que a Ele, o nosso Deus, jamais O decepcionaremos.


Ele conhece-nos exactamente.
Conhece o estranho mundo de trevas e luz que nos habita,
conhece melhor que nós esta mistura misteriosa que somos,
sabe aquilo de que somos capazes.
Os outros podem ser decepcionados por nós porque formam sonhos a nosso respeito
e nos projectam no ideal;
Deus nunca Se decepciona, porque aquele que ama, é aquele que eu sou hoje;
Deus não vive no futuro nem no passado mas sim no presente.
Ele "é" o presente e vê-me na minha realidade presente.»

(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

PORTA DE ESPERANÇA


"O vale de Acor é um vale perto de Jericó,
feito de desfiladeiros perigosos, cheios de serpentes, de escorpiões,
de enormes aranhas e de animais selvagens,
o lugar do medo onde se evitava penetrar,
o lugar de que todos se afastavam, que todos evitavam.
Ora Deus diz que este vale da infelicidade
pode tornar-se uma porta de esperança.
É muito misterioso e cheio de promessas.

Em cada de um de nós há um vale de Acor,
coisas em nós que não queremos olhar,
de que não queremos lembrar-nos nem aproximar-nos, coisas que contornamos,
de que nos afastamos porque nos fazem sofrer e todos nós temos medo do sofrimento.

Há pessoas, também, que não queremos ver,
que evitamos porque nos incomodam;
são demasiado diferentes,
demasiado sofredoras e o seu sofrimento causa-nos medo.

Ora Deus diz: se penetrares nesse lugar que procuras evitar,
ele tornar-se-á uma "porta de esperança".

Se te aproximares daqueles que são rejeitados,
que são evitados, que são excluídos,
que são esmagados ou que são escondidos em asilos e instituições,
porque incomodam e se tem vergonha deles,
então, descobrirás que eles são "porta de esperança".

Da mesma forma, se em ti te aproximas do que te faz sofrer ou te causa medo,
dos bloqueios, das durezas, das resistências,
das coisas de que tens vergonha ou que não queres ver,
se ousares penetrar Comigo no teu vale de Acor pessoal, diz o Senhor,
então isso tornar-se-á "porta de esperança".

Sós, não encontraremos o caminho.
É com Jesus que devemos avançar,
mão na mão.»

(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

O GRANDE SEGREDO


Respondeu-lhe Jesus: «Se conhecesses o dom de Deus e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu é que lhe pedirias e ele havia de dar-te água viva!»
Disse-lhe a mulher: «Senhor, tu não tens com que tirá-la, e o poço é fundo; donde, pois, tens essa água viva? És tu, porventura, maior do que o nosso pai Jacó, que nos deu o poço, do qual também ele mesmo bebeu, e os filhos, e o seu gado?
Replicou-lhe Jesus: Todo o que beber desta água tornará a ter sede; mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der há-de tornar-se nele uma fonte de água jorrando para a vida eterna.» (João 4, 10-14)


"Quande se ama alguém, dá-se-lhe a vida,
dá-se-lhe confiança em si próprio,
mostra-se-lhe como é belo,
revela-se-lhe o poder do amor que está nele
e a sua capacidade para dar a vida.

Dizendo a essa mulher da Samaria que nela a água que Ele, Jesus, lhe ia dar
se tornaria nela "nascente de água jorrando para a vida eterna",
Jesus revela-lhe que há nela um poço,
uma nascente, uma fonte divina.

Nós não sabemos que há em nós essa nascente.
Sabemos que temos uma inteligência,
sabemos que podemos produzir coisas,
sabemos que temos emoções, desejos, pulsões,
mas ignoramos que há em nós
um poço de ternura,
uma fonte que pode dar a vida,
uma nascente que pode comunicar o próprio amor de Deus.

Jesus revela à samaritana este mistério que está nela:
ela é capaz de amar, pode tornar-se um poço, uma nascente de vida eterna
se matar a sede na nascente que é Jesus.

É o grande segredo para cada um de nós:
se bebemos na nascente que é Jesus,
podemos tornar-nos fonte de ternura que dá vida ao mundo
e corresponder ao desejo de Jesus de que sejamos fecundos e produzamos muito fruto."

(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

DEIXAR DEUS SER DEUS

"Pecar é recusar deixar Deus ser Deus.

Arrepender-se é deixar que Deus seja Deus na nossa vida.
A primeira mensagem de Cristo é "arrependei-vos e acreditai na Boa Nova". "Arrependei-vos" quer dizer, "voltai-vos para Mim e tomai consciência do Meu amor para convosco"
Reconhecer que somos pecadores e arrepender-nos é um processo contínuo que dura a vida inteira. Antes da morte não podemos atingir um estágio em que já não precisemos de arrependimento, porque há níveis sobre níveis de consciência dentro de nós, e a cada momento da nossa existência podem revelar-se esses níveis se o permitirmos, e mostrar-nos a profundidade da tendência que há em nós para recusarmos que Deus seja Deus.

Deus é paciente, vai-nos revelando gradualmente o pecado que há em nós. Parece não se preocupar com os nossos erros passados, embora os seus efeitos ainda nos possam causar sofrimento a nós e aos outros. "Embora os vossos pecados sejam como o escarlate, tornar-se-ão brancos como a neve" (Is 1, 18). O que Lhe importa é a direcção que levamos na vida. Se nos voltarmos para Ele - não importa que estejamos longe - Ele aproxima-se para nos receber.

O verdadeiro pecado está em recusar, ou em ter medo de me voltar para Ele, seja porque estou contente com aquilo que sou, seja porque julgo que devo primeiro pôr as minhas coisas em ordem, antes de me virar para Ele. » (George W. Hughes, em "O Deus das supresas")

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O VERDADEIRO PECADO

"É muito importante compreender o que é o pecado.
O pecado não é, em primeiro lugar, transgressão da lei.
É isso mas não em primeiro lugar.
Toda a Sagrada Escritura, e em especial os Evangelhos e as epístolas de São Paulo
dizem-no muito claramente.

Pecar é virar as costas a Jesus, deixar de ter confiança n´Ele,
não acreditar nas suas promessas e na sua palavra,
duvidar da sua aliança
e não continuar a alimentar-se da sua presença.
Pecar é desligarmo-nos da vida de Jesus,
deixar de viver em comunhão com Ele,
recusar o seu corpo e o seu sangue,
rejeitar a sua palavra.

É evidente que se vai então transgredir a lei,
transgredir todas as leis."

(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

domingo, 7 de setembro de 2008

Vivos em Jesus

«Para vivermos do Evangelho.
para amarmos os nossos inimigos,
para estarmos próximos dos pobres,
para sermos fiéis no sacramento do matrimónio,
para vivermos com amor,
é preciso estarmos vivos
e só podemos estar vivos se estamos em comunhão com Aquele
que é a própria Vida.


Quando Jesus diz à mulher apanhada em flagrante adultério: "Vai e não tornes a pecar",
diz de facto: "Vai e não Me deixes mais. Permanece no meu amor.
Aceita viver.
Alimenta-te da minha presença, alimenta-te do meu amor, do meu corpo e do meu sangue.
Escolhe o que é bom para ti e te faz viver".


É verdade, é preciso estar atento: há alimentos envenenados,
falsos amigos, maus filmes, maus livros,
formas de viver que pouco a pouco, se não tivermos cuidado,
podem afastar-nos de Jesus e destruir-nos.


É preciso estarmos atentos, pois, de facto,
se não somos seres que estão vivos, seres que estão de pé,
transgredimos a lei.
Se estivermos mortos,
se nos separarmos da fonte da vida,
não transmitiremos aos outros senão a morte.


Então, aprendamos a alimentar-nos bem:
da Palavra de Deus,
do Corpo de Jesus,
da oração
e desse misterioso sacramento da presença de Jesus no pobre

(Jean Vanier, em "A Fonte das Lágrimas")

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

"A fé torna-nos capazes de pensarmos como Deus, tanto no que respeita à nossa pessoa como a tudo aquilo com que contactamos. Crer significa, portanto, sintonizar e identificar o nosso pensamento com o de Deus.

O mundo criado à nossa volta é como que a expressão de uma voz que nos fala. Se a nossa fé é fraca essa voz produz em nós a dispersão, afasta-nos de Deus e leva a centrarmo-nos em nós próprios. Mas, quando a fé cresce, dá-se o processo inverso: o mundo exterior começa a falar-nos de Deus, a atrair-nos para Ele, torna-se sinal da Sua presença. Além disso, ajuda-nos a entrar em contacto com Ele e transforma-se num lugar de encontro com Deus.

É a fé que te torna capaz de ultrapassar as aparências, de distinguir a causa primeira das causas segundas e de ver que aquilo que se passa em teu redor, não é fruto do poder dos homens. A fé permite-te descobrir os sinais de Deus na Criação, oferece-te a possibilidade de acolheres os acontecimentos como expressão da Vontade de Deus e de os ver como uma passagem de Deus na tua vida" (Tadeusz Dajczer, em "Meditações sobre a fé")

INDAGAÇÕES SOBRE O CARPINTEIRO

“A árvore é força vertical da natureza, da terra em direcção ao céu. Tem a postura da espécie humana. Por isso o cego que Jesus curou em Bet...